domingo, 17 de outubro de 2010

Entrevistando Luís Sérgio O. Valentim

                                           Vista de SP- 1930

O Observatório Social " De olho no solo" fez um entrevista escrita com o Arquiteto Luís Sérgio Ozório Valentim, pesquisador da Faculdade  de Arquitetura e Urbanismo - FAU da USP.

Luís Sérgio realizou um levantamento para FAU, apontando a relação entre os eixos históricos de industrialização da Região Metropolitana de São Paulo, a produção de impactos ambientais e a identificação de cenários de risco à saúde da população.

Autor do livro Requalificação urbana, contaminação do solo e riscos à saúde” 
Annablume/FAPESP, 2007








  Leia agora a entrevista feita pelo Observatório Social

Observatório: Fale um pouco sobre sua atividade profissional, sua formação e sobre sua dissertação de Mestrado.
    Luís Sérgio: Formei-me em arquitetura, com especialização em gestão ambiental pela Faculdade de Saúde Pública da USP e doutorado em Planejamento Urbano e Regional pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP.
    Sou diretor de Meio Ambiente do Centro de Vigilância Sanitária e represento a Secretaria de Estado da Saúde, dentre outros, nos Conselhos Estaduais de Meio Ambiente (Consema) e de Recursos Hídricos (CRH).
    Sou autor do livro “Requalificação urbana, contaminação do solo e riscos à saúde” (Annablume/FAPESP, 2007) e minha pesquisa de doutorado teve por título “Sobre a produção de bens e males nas cidades: estrutura urbana e cenários de risco a saúde em áreas contaminadas na Região Metropolitana de São Paulo”. Trato, em síntese, da natureza estruturalmente desequilibrada das metrópoles e da conseqüente formação de cenários de risco à saúde, tidos como um conjunto de fatores determinantes da saúde considerados a partir de suas localizações e interações. Quem tiver interesse, pode acessá-la no endereço www.teses.usp.br.
    Minhas pesquisas almejam, essencialmente, colaborar para a integração de políticas públicas de saúde, meio ambiente e desenvolvimento urbano.

    Observatório: Qual a região mais crítica, quando se fala em área contaminada em São Paulo?

    Luís Sérgio: As contaminações do solo estão associadas àqueles territórios onde o modelo de desenvolvimento de bases urbanas e industriais se expressou com maior desenvoltura.
     A Região Metropolitana de São Paulo é onde as consequencias desse modelo se mostram mais agudas, concentrando cerca de metade das 2094 áreas atualmente cadastradas como contaminadas no estado.
    Porém, a mancha urbana metropolitana não é homogênea. Apesar dos postos de combustíveis, que representam quase 80% das áreas contaminadas até o momento cadastradas, estarem distribuídos com certa uniformidade nas áreas urbanizadas da RMSP, podemos considerar que a contaminação do solo ocorreu mais intensamente nos eixos radiais historicamente associados à ocupação industrial e à estruturação metropolitana.
    Na pesquisa, eu identifico na metrópole nove eixos mais significativos e outras três zonas setorizadas de industrialização. Entendo que os eixos mais críticos, que encerram maior carga simbólica e que mais representam os dramáticos processos de reestruturação produtiva que ocorrem hoje na RMSP sejam os que denominei na tese como Centro daCapital/Ferrovia Santos-Jundiaí/ABCCentro da Capital/Ferrovias Santos-Jundiaí e Sorocabana/Rodovia Castelo Branco/Osasco. Eles formam um arco envolvendo os rios Tietê e Tamanduateí, com extremidades apontando para os municípios de São Caetano do Sul e Osasco.

      Observatório: Qual sua visão sobre a requalificação de remanescentes do parque fabril paulistano para fins de moradia considerando o exemplo do Condomínio barão de Mauá?

        Luís Sérgio: O Condomínio Barão de Mauá – um conjunto residencial com mais de 50 prédios assentados diretamente em lote antes usado como lixão industrial – é um daqueles momentos infelizes – e exemplares – da nossa história urbana e industrial. Atualmente é pouco provável que um caso como este se repita com tamanha facilidade, pois ao longo destes últimos anos aprimoramos os mecanismos legais e institucionais para evitá-lo.
        A requalificação urbana de áreas com contaminação do solo é outra história. Parte de um conhecimento prévio da situação de contaminação do território é da consciência da importância para a sociedade de pleno uso – social e ambientalmente aceitável – das áreas urbanas.
        Não podemos nos dar ao luxo de desprezar as regiões com histórico de industrialização por tê-las como contaminadas, sob pena de espraiarmos ainda mais a cidade. Muitas dessas áreas são atualmente pouco atraentes pela inviabilidade econômica de remediá-las para um novo uso. Cabem, nesse caso, políticas públicas mais incisivas de desenvolvimento urbano e de regulação de riscos, que induzam requalificações.

        Observatório: Qual o papel da sociedade civil no acompanhamento de manchas contaminadas em São Paulo?
          Luís Sérgio: Só num contexto de plena liberdade, num estado democrático de direito, é que podemos realmente enfrentar as mazelas derivadas de um modelo de produção e consumo historicamente descompromissado com o ambiente. Esse enfrentamento é coletivo e não circunscrito ao poder público. Assim posto, a sociedade civil em geral tem papel importante no tocante às áreas contaminadas.
          Para que a participação social não se circunscreva à indignação exasperada e ao mero denuncismo, é importante fomentar o debate, garantir transparência às políticas públicas e investir em comunicação de riscos.  
          Observatório: Qual sua opinião sobre a operação urbana Lapa – Brás?

          Luís Sérgio: As operações urbanas Lapa/Brás e Mooca/Vila Carioca praticamente coincidem com o arco histórico de industrialização – nas várzeas dos rios Tiete e Tamanduateí – que mencionei anteriormente. Quem se dedica a analisar os processos de contaminação e reestruturação urbana da metrópole tinha expectativas de que fossem promovidas políticas públicas nesse sentido. O Plano Diretor Estratégico do município, de 2002, fundamentou tais políticas e estendeu o olhar, ainda que timidamente, para os passivos ambientais que então emergiam na forma de áreas contaminadas. As operações urbanas são bem vindas, pois anunciam a abordagem das áreas contaminadas a partir de sua inserção no tecido urbano, superando – espero eu – o entendimento desses passivos apenas como frações isoladas e fragmen tadas do território, sujeitas a políticas públicas setorizadas.
            A região – varzeana, de beira-linha – abrangida por essas operações urbanas conta muito da história da cidade. A Vila Carioca – assentada às várzeas do Tamanduateí, no bairro do Ipiranga – foi tema de meu livro sobre requalificação urbana, contaminação do solo e riscos à saúde. Ela esta assentada num território cuja história representa muito bem certo modelo de industrialização e expansão urbana, cujos primórdios datam de mais de século e cujas mazelas passamos a melhor conhecer recentemente.  

            (15/10/10)

             Nós responsáveis pelo Observatório Social " De olho no solo" agradecemos ao Luís Sérgio pela participação em nosso blog, através desta entrevista.
             Parabéns pelo ótimo trabalho Luis Sérgio!
            Érica Sena

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